domingo, 8 de agosto de 2010

Inclusão é conhecimento

Não basta educar alunos e professores com o auxílio do computador: é preciso formar cidadãos que utilizem a tecnologia com autonomia intelectual. A boa notícia é que iniciativas dos governos brasileiros já começam a frutificar.
Durante o ano passado, a Escola Estadual de Ensino Fundamental Luciana de Abreu, de Porto Alegre, participou de um projeto que vem recebendo bastante atenção no Brasil: utilizar o computador como ferramenta pedagógica para o ensino nas salas de aula. Com um computador portátil disponível para cada um dos 350 alunos e 50 professores, a experiência mostrou que os estudantes obtêm melhores resultados e aponta para um caminho eficaz no processo de inclusão digital brasileira. Os equipamentos foram fornecidos pelo projeto Um Computador por Aluno (UCA), do governo federal, cujo piloto foi implantando na capital gaúcha e também nas cidades de São Paulo, Brasília, Palmas e Piraí. "Em poucos meses, notamos que os estudantes lêem mais, sentem-se valorizados, faltam pouco às aulas e adquirem prazer pelo aprendizado", conta Lenize Simon Gehrke, professora de Ciências da escola. E não apenas isso. Lea Fagundes, pesquisadora do Laboratório de Estudos Cognitivos da UFRGS, que auxilia os professores envolvidos no UCA, salienta que, quando a pedagogia é bem aplicada, a internet pode revolucionar a educação: "Os alunos passam a analisar criticamente as informações e têm sua atenção e concentração aumentadas. A internet melhora sobretudo a auto-estima e o desejo de continuar aprendendo sem medo do fracasso", diz. Com o sucesso do trabalho, o governo lançou, em dezembro do ano passado, edital de licitação para adquirir 150 mil laptops que serão distribuídos a 300 escolas públicas de todos os Estados. Nos projetos-piloto haviam sido utilizadas 1,39 mil máquinas doadas pelas empresas fabricantes.
Cecília Leite, coordenadora-geral do programa de inclusão social do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, acredita que o primeiro passo para alavancar o acesso à rede no país deve ser dado no ensino básico da escola pública. "Apenas fornecer equipamentos não basta. O sistema educacional do Brasil não está preparando professores para esta nova linguagem de ensino, que exige outro tipo de capacidade para transmitir o conhecimentoo. É urgente investir na educação digital, começando com quem pode difundi-la", afirma.
No Rio Grande do Sul, os Núcleos de Tecnologia Educacional da Secretaria da Educação oferecem algumas oficinas aos professores, mas especialmente noções básicas sobre sistemas operacionais e navegação na internet. "O professor precisa de mais conhecimento sobre comunicação e domínio da lógica de programação, fundamentais para que haja inclusão digital. Isso é importante para que eles se transformem não somente em usuários, mas em aprendizes apaixonados e desenvolvedores de soluções", defende Lea Fagundes.
Segundo a pesquisa TIC Domicílios e Usuários 2007, divulgada recentemente pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, a falta de educação digital é o principal motivo para o ínfimo uso da rede mundial. Os números revelam que 55% das pessoas não utilizam a internet por pura falta de habilidade. "Para que o cidadão participe da era digital é necessário proporcionar a ele autonomia intelectual", analisa Cecília. Isso se traduz em saber como buscar informação na rede e o que fazer com essas informações.
A análise também é uma crítica às limitações dos telecentros existentes. De acordo com o Mapa da Inclusão Digital no Brasil, desenvolvido pelo IBICT, existem no país 17,5 mil locais com computadores para acesso público e gratuito à internet. São Paulo concentra 22% dos telecentros. O Rio Grande do Sul aparece em oitavo lugar, com 774 telecentros, ou 4,4% do total. A segunda parte da pesquisa será coletar informações qualitativas sobre esses locais, o que será feito ao longo do ano.
A criação de mais telecentros, entretanto, pode não ser suficiente para satisfazer a demanda de acesso e a necessidade de conhecimento digital. Em 2006, eles atendiam apenas 3% dos internautas e, um ano depois, 6%. Entre os empreendimentos que vêm ganhando importância estão, curiosamente, as lan houses - lojas que oferecem acesso pago à rede, freqüentadas principalmente por adolescentes que buscam alternativas para participar de jogos em rede ou bate-papo virtual. Em 2006, 30% das pessoas que acessavam a internet se conectavam nesses locais, número que subiu para 49% no ano seguinte. "Quanto antes o jovem encarar o computador como uma ferramenta básica, não apenas com fonte de diversão usada esporadicamente na escola ou em lan houses, mais cedo ele estará inserido na realidade digital", explica Cecília, do IBICT.
Enquanto todas as escolas públicas não acertam o passo com o projeto UCA, algumas iniciativas dão conta de integrar centenas de pessoas à nova realidade. Em Porto Alegre, a experiência mais representativa é do Centro de Capacitação Digital (CCD) da Procempa, que treinou 397 pessoas nos dois primeiros meses de 2008. Outro importante programa na capital ocorre no Centro de Recondicionamento de Computadores (CRC). Integrante do projeto Computadores para Inclusão, do governo federal, a idéia está baseada em uma experiência canadense que recicla os equipamentos para uso nas escolas. Além dos 2 mil computadores já recondicionados, o CRC mantém bolsas de estudo para 88 jovens em situação de vulnerabilidade social, que trabalham na recuperação dos equipamentos no turno inverso ao da escola. "Com o conhecimento que adquirem em montagem, configuração, programação e redes, eles se tornam rapidamente profissionais da informática", afirma Fabio Carlson, coordenador do projeto. Também há CRCs em Guarulhos (SP) e em Gama (DF).

Referência:
CENÁRIOS DO AMANHÃ. Inclusão é conhecimento. Disponível em http://www.amanha.com.br/NoticiaDetalhe.

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